"Viagem à Paisagem Llansol". Por Prof. Lúcia Castello Branco

Para compartilhar um pouco da beleza que ainda anda permeada em nosso mundo, postarei algo da professora por excelência Lúcia Castello Branco. Professora da Universidade Federal de Minas Gerais e escritora que tem a poesia entranhada em qualquer de suas escritas, Lúcia nos presenteia com análises minuciosas e líricas da obra de Maria Gabriela Llansol.
A carta a seguir é um belo fragmento do grandioso trabalho de Lúcia sobre Llansol.


Viagem à paisagem Llansol
Data: 08/08/2008
Lucia Castello Branco


Segundo filme da série “Os absolutamente sós”, cujo foco se volta para a relação se sujeitos singulares com a literatura (o primeiro da série foi o longa-metragem Língua de Brincar, sobre Manoel de Barros), o documentário Redemoinho-Poema, dirigido por Lucia Castello Branco e Gabriel Sanna, percorre as paisagens da escritora portuguesa Maria Gabriela Llansol (1930-2008), na Bélgica e em Portugal, focalizando as figuras de seu texto e de seu afeto. Com ênfase na escrita e na legência, o filme culmina na cena das mãos de Llansol, em sua casa em Sintra, no trabalho de revisão das provas de seu último livro: Os cantores de leitura. O texto-carta de Lúcia Castello Branco, escrito por ocasião da morte da escritora, é também um comentário da legente à cena das mãos de Llansol:


Querida Gabriela,

Em resposta à tua carta de 5 de janeiro de 2008, que só há poucos dias me chegou às mãos, em resposta à tua carta ditada, e escrita na letra de Cynthia, mas que traz abaixo a tua assinatura em letra trêmula e difícil, começo por te dizer que aqui, do outro lado do Atlântico, não são de nevoeiro os dias, mas de fortes chuvas e calor.
Mas em seguida me lembro de como era azul o céu na Serra de Sintra, naquela manhã em que estivemos em tua casa a filmar as imagens destas mãos — as tuas e as de Vina — no trabalho concentrado de revisão de Os Cantores de Leitura.
Olho para estas mãos agora — as tuas e as de Vina — e reparo no anel e na gema do anel e na chama de amor no interior de um anel. Olho para estas mãos que marcam, com firme delicadeza, o texto. E penso no teu legado mais forte: a responsabilidade da forma.
Penso que agora, neste momento em que começas a atravessar o nevoeiro, um pouco do nosso mundo do lado de cá parece ruir. Mas logo me lembro do teu texto, Gabriela, e, como Cantora de Leitura pelo texto convocada, devo assim fazer a minha prece:
Não há qualquer nervosismo em tua mão, que se molda à própria forma com grande destreza. Os teus ouvidos ouvem ____________ e respiram profundamente incitando o teclado, seja o do piano, seja o do papel, a segurar a estrela que vai cair.
E então olho de novo para as tuas mãos, Gabriela, ao lado das mãos de Vina, e sobre elas pouso as minhas mãos, as mãos de Vania, as de Inês e as de Cynthia. Assim:
Não há qualquer nervosismo em nossas mãos, que se moldam à própria forma com grande destreza. Os nossos ouvidos ouvem __________ e respiram profundamente incitando o teclado, seja o do piano, seja o do papel, a segurar a estrela que vai cair.
Sim, Gabriela, atravessaremos juntas a paisagem de nevoeiro e chuva e quase neve. Porque um dia atravessamos juntas o sol de teu nome, escrito hoje na curvatura da abóboda celeste. Tudo, aqui ou lá, continua a vibrar. E, em nome da cena fulgor que nos acompanha,
aqui ou ali, o teu nome vive, nela.

Lucia
Belo Horizonte, 3 de março de 2008.

Créditos: http://www.abpcomunidade.org.br/cultura/revista/exibir/?id=17

5 Response to ""Viagem à Paisagem Llansol". Por Prof. Lúcia Castello Branco"

  1. Sarah Says:

    Belas palavras. Obg por compartilhar simone.
    bjs

  2. Susan Maria Says:

    fiquei emocionada e instigada a conhecer mais sobre Gabriela Llansol e o trabalho da professora.
    agradecida Simone.
    Abs

  3. Flávia Cunha Says:

    milhoes de vezes obrigada por compartilhar tamanha beleza.....

  4. Maria Clara Says:

    lindo!

  5. Inês Maria Says:

    tao intensa essa carta....
    obg simone por compartilhar conosco.
    o seu espaço é lindo
    não nos deixe muito tempo sem essas primazias.
    abraços

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